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Microcefalia e Zika: os números podem estar superestimados?

Alexandre Faisal

12/02/2016 16h30

 

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A infecção pelo vírus Zika preocupa as gestantes no Brasil. Pesquisadores brasileiros publicam artigo no periódico Lancet discutindo os (reais) números da epidemia e qual o critério diagnóstico mais adequado para microcefalia 

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      O Brasil enfrenta seu primeiro surto do vírus Zika, particularmente na região nordeste. Embora a maioria dos casos de infecção pelo vírus seja auto-limitada e sem seqüelas, há grande preocupação com o impacto do vírus Zika sobre o feto no caso de transmissão durante a gestação. A relação causal entre a exposição uterina ao Zika e a microcefalia ainda está próxima de ser estabelecida e é um tema de interesse mundial. Entre meados de 2015 e 30 de janeiro de 2016, foram notificados 4783 casos suspeitos de microcefalia, sendo que dos 1103 casos analisados laboratorialmente, 404 (36.2%) foram confirmados como casos de microcefalia.

          Os resultados impressionam, mas pesquisadores brasileiros recomendam cautela na interpretação destes resultados. Eles sugerem que esta taxa de verdadeiros positivos (36.2%) pode estar sendo influenciada por ampliação da investigação dos bebês que nascem com deformidades cranianas (em função do estado atual de preocupação com o vírus Zika). Outra explicação é a mudança nos critérios de definição de microcefalia. De fato, em dezembro de 2015, o Ministério da Saúde reduziu o critério de microcefalia, considerando o tamanho da circunferência craniana do recém-nascido de termo como igual ou menor que 32 cm. O critério anterior era 33 cm. No entanto, existem outros critérios de definição que são, segundo os autores, mais adequados. Cabe lembrar que teste muito sensível aumenta os casos de falsos positivos, enquanto teste mais específico aumentam os casos de falso negativos e que o ganho de sensibilidade se acompanha de perda da especificidade (e vice-versa).

        No caso em questão, os pesquisadores sugerem que é melhor usar um teste mais específico, já que não há um tratamento efetivo para a má-formação cerebral fetal. Mais ainda, a opção por um teste diagnóstico com boa capacidade de detecção dos verdadeiros casos negativos (os bebês saudáveis) e com menos casos de falso-positivos reduziria o dano potencial da realização de tomografia craniana, usada para confirmação diagnóstica nos casos suspeitos. Estima-se que o potencial iatrogênico da radiação pela tomografia seja 100 vezes o do raio X de tórax. Por outro lado, a opção por este teste mais específico (e, portanto, menos sensível) implica que alguns casos (verdadeiros) de microcefalia não serem detectados e estes bebês, infelizmente, não receberão estimulação intelectual precoce.

       O cenário atual é com certeza preocupante e a definição dos critérios diagnósticos só ficará mais clara com os resultados das investigações dos casos suspeitos. Mas até lá estamos todos torcendo para que a epidemia seja controlada.

(Victora et al. Microcephaly in Brazil: how to interpret reported numbers?. Lancet  February 5, 2016 http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(16)00273-7)

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Sobre o Autor

Alexandre Faisal é ginecologista-obstetra, pós-doutor pela USP e pesquisador científico do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP. Formado em Psicossomática, pelo Instituto Sedes Sapientiae, publicou o livro "Ginecologia Psicossomática" e é co-autor do livro "Segredos de Mulher: diálogos entre um ginecologista e um psicanalista”. Atualmente é colunista da Rádio USP (FM 93.7) e da Rádio Bandeirantes (FM 90.9). Já realizou diversas palestras médicas no país e no exterior. Apresenta palestras culturais e sobre saúde em empresas e eventos.

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